Representantes dos países participantes na XV Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e do Caribe, que terminou hoje na Argentina, se comprometeram a “adotar marcos normativos que garantam o direito ao cuidado através da implementação de políticas e sistemas integrais de cuidado sob as perspectivas de gênero, interseccionalidade, interculturalidade e direitos humanos”.
O Compromisso de Buenos Aires reconhece “o cuidado como um direito das pessoas a cuidar, a serem cuidadas e a exercer o autocuidado com base nos princípios de igualdade, universalidade e corresponsabilidade social e de gênero e, portanto, como uma responsabilidade que deve ser compartilhada pelas pessoas de todos os setores da sociedade, as famílias, as comunidades, as empresas e o Estado”.
O principal fórum intergovernamental regional das Nações Unidas sobre os direitos das mulheres e a igualdade de gênero, que este ano comemora seu 45º aniversário, começou na segunda-feira na capital da Argentina e reuniu delegadas e delegados de 30 países da América Latina e do Caribe e de outras regiões, além de representantes de 17 agências das Nações Unidas e 14 organismos intergovernamentais. A eles somaram-se parlamentares de 15 países da região e mais de 750 integrantes da sociedade civil, num total de 1.168 participantes.
Na sessão de encerramento participaram Raúl Garcia-Buchaca, Secretário Executivo Adjunto para Administração e Análise de Programas da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL); Maria-Noel Vaeza, Diretora Regional para as Américas e o Caribe de ONU Mulheres; Ayelén Mazzina, Ministra das Mulheres, Gêneros e Diversidade da Argentina; e Amina J. Mohammed, Vice-Secretária-Geral das Nações Unidas (por vídeo).
“Saudamos o grande compromisso político acordado em Buenos Aires, que nos permitirá avançar em políticas concretas para tornar realidade, em toda a região e em todos os seus territórios, os direitos e a autonomia das mulheres e seguir fortalecendo a Agenda Regional de Gênero, como fazemos há 45 anos. Com a convicção de renovar nossas reflexões a partir das crises em cascata que nos interpelam, a CEPAL propõe continuar os esforços feministas de transformação e uma profunda mudança civilizatória: a sociedade do cuidado”, disse Raúl Garcia-Buchaca, Secretário Executivo Adjunto da CEPAL; ele enfatizou que “o financiamento das políticas de cuidado é imprescindível para reverter as desigualdades de gênero e garantir os direitos de todas as mulheres”.
“É durante as crises que temos que nos atrever a sonhar. Este encontro em Buenos Aires significou um impulso sem precedentes a um novo modelo de desenvolvimento que estamos promovendo a partir de organizações feministas e de mulheres, organismos internacionais e parlamentos: a sociedade do cuidado. Confiamos em que os Estados e o setor privado se somem a este grande esforço para corrigir desigualdades históricas, ajudar a cuidar do planeta e, finalmente, aumentar as oportunidades para toda a sociedade, especialmente as mulheres em toda a sua diversidade, as mulheres indígenas, rurais, afrodescendentes, com deficiência, meninas, adolescentes e idosas, migrantes e refugiadas, do coletivo da diversidade e que vivem com VIH”, disse Maria-Noel Vaeza de ONU Mulheres.
A Ministra Mazzina assinalou: “Como argentina e feminista, é para mim motivo de orgulho que o Compromisso de Buenos Aires se some à Agenda Regional de Gênero. Chegamos a este dia com um percurso enorme por todo o país, com a convicção de construir coletivamente uma posição comum que represente todas as vozes. Fizemos isso graças à cooperação de todas as pessoas, que nutriram de diversidade cada um dos debates que levaram a estes acordos”.
“A Argentina assumiu com responsabilidade e alegria o papel que nos toca ao exercer esta presidência. Temos pela frente três anos em que trabalharemos para construir um futuro de igualdade, com desenvolvimento sustentável e justiça social", ressaltou.
Finalmente, Amina J. Mohammed destacou a contribuição da Agenda Regional de Gênero e sublinhou: “A distribuição desigual do trabalho de cuidados, a ausência de serviços de cuidados e a falta de reconhecimento do valor social do trabalho doméstico abalam diretamente a igualdade de gênero”. Neste sentido, instou os países da região a “desenvolver sistemas integrais de cuidado e redistribuir tempo, poder e recursos” para obter uma verdadeira igualdade de gênero, o que exige financiamento adequado.
Os delegados e delegadas dos países presentes na Argentina reconheceram o trabalho realizado pelo Observatório de Igualdade de Gênero da América Latina e do Caribe e agradeceram a elaboração do documento de posição da Conferência, bem como a publicação Romper o silêncio estatístico para alcançar a igualdade de gênero em 2030: aplicação do eixo sobre sistemas de informação da Estratégia de Montevidéu para a Implementação da Agenda Regional de Gênero no âmbito do Desenvolvimento Sustentável até 2030, ambos preparados pela CEPAL.
Durante a reunião também foi apresentado o documento O financiamento dos sistemas e políticas de cuidados na América Latina e no Caribe: contribuições para uma recuperação sustentável com igualdade de gênero, elaborado pela CEPAL e ONU Mulheres.
No Compromisso de Buenos Aires os países acordaram “formular, implementar e avaliar as políticas macroeconômicas, especialmente as políticas fiscais (receita, gastos e investimento), com um enfoque de igualdade de gênero e direitos humanos, salvaguardando os avanços alcançados e mobilizando os máximos recursos disponíveis para aumentar o investimento público sustentável no tempo destinado a políticas e infraestruturas de cuidado, a fim de garantir o acesso universal a serviços de cuidado módicos e de qualidade”.
Da mesma maneira, os representantes se comprometeram a “que as medidas de ajuste fiscal ou de cortes orçamentários dirigidas a enfrentar as situações de desaceleração econômica se adéquem aos princípios de direitos humanos e de não discriminação, evitando especialmente os cortes em programas e apoios que podem gerar aumento dos níveis de pobreza e a sobrecarga de trabalho não remunerado e de cuidados que afeta as mulheres”.
A resolução também incentiva os governos da América Latina e do Caribe e de outras regiões, os países desenvolvidos, os organismos, fundos e programas das Nações Unidas e outros atores relevantes a fornecerem recursos financeiros para a sustentabilidade do Fundo Regional de Apoio a Organizações e Movimentos de Mulheres e Feministas.
Finalmente, os países agradeceram ao povo e ao governo da Argentina por acolherem a XV Conferência Regional e o oferecimento do Governo do México para sediar a próxima Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e do Caribe em 2025.
O programa da XV Conferência Regional sobre a Mulher incluiu o lançamento de diversos documentos com recomendações de política, um debate de alto nível sobre a sociedade do cuidado, painéis temáticos sobre financiamento dos cuidados e o cuidado do planeta e uma mesa-redonda sobre corresponsabilidade dos cuidados, além de 30 eventos paralelos, um Fórum Parlamentar e um Fórum Feminista.