OPINIÃO
Joseluis Samaniego, Diretor da Divisão de Desenvolvimento Sustentável e Assentamentos Humanos da CEPAL:
Perspectivas para Rio+20
Foto: Lorenzo Moscia/CEPAL

A região da América Latina e Caribe encontra-se atualmente em uma situação consideravelmente melhor que no passado para responder às proposições que se aprovem na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, denominada Rio+20, que será realizada em junho de 2012 no Brasil, assim como para tomar medidas econômicas que facilitem o trânsito em direção a um desenvolvimento sustentável.

A Cúpula da Terra, realizada no Rio de Janeiro em 1992, transformou a noção de desenvolvimento em um conceito integral, havendo assumido a sustentabilidade como objetivo universal e novo paradigma. Dessa instância surgiu uma agenda de trabalho, 26 princípios e 3 convenções econômico-ambientais de grande alcance, como a sobre mudança climática para enfrentar o aquecimento global.

Nesse momento culminava uma década muito difícil para a América Latina e o Caribe, a de 1980, denominada "a década perdida", marcada por volatilidade do crescimento, fuga de capitais, desvalorização das moedas e dos salários, tentativas de controle de taxas de inflação de dois dígitos, e também pelo peso da dívida externa.

Durante a década de 1990, as economias da região alcançaram grandes avanços em gestão macroeconômica para a estabilização nominal e o controle do endividamento, privatizando numerosos ativos públicos e abrindo as economias à competição internacional em praticamente todos os sectores. Neste contexto, dados o lento crescimento do emprego formal e da proteção social, a competição salarial global e a maior vulnerabilidade social aos choques externos, por meio dos programas de transferências condicionadas realizaram-se importantes progressos no pilar social.

A cúpula de 1992 motivou o fortalecimento dos marcos normativos para a proteção ambiental e das instituições para a gestão do meio ambiente, sem a solidez existente em outras áreas do desenvolvimento como energia, infraestrutura, agricultura e finanças, mas refletindo uma crescente importância das preocupações ambientais no desenvolvimento nacional.

Nestes 20 anos, na América Latina e Caribe, o pilar que não se modernizou para orientar-se ao desenvolvimento sustentável, foi o da política econômica.

Observamos o abandono das contas do meio ambiente integradas aos sistemas de contabilidade nacional, a dominante ausência de instrumentos fiscais para taxar danos ambientais, a falta de fixação de preços das externalidades negativas nos projetos de investimento, a lenta inclusão de critérios ambientais na compras públicas, o aumento de subsídios regressivos e contraproducentes aos combustíveis fósseis, o desinvestimento nos sistemas de transporte de massa (salvo exceções) e nos sistemas de manejo adequado de resíduos sólidos, a desarticulação entre os entornos urbanos e nacionais quanto a responsabilidades com o meio ambiente, a crescente importância do transporte privado e os incentivos ao uso de carbono nas matrizes energéticas e à expansão das fronteiras agropecuárias, entre outros.

Os preparativos para a cúpula Rio+20 ocorreram em plena crise financeira global, sendo fortemente influenciados por esta. Por sua profundidade em 2008, considerou-se a necessidade de fazer um esforço econômico-social semelhante ao da crise de 1929, com um novo pacto (A Green New Deal, PNUMA). Um pacto baseado em investimentos em setores com reduzido impacto ambiental, baixos em carbono e altos em emprego como motores da recuperação. Este conceito foi aplicado em países desenvolvidos, particularmente na Europa, e em alguns em desenvolvimento, como China e Coreia, enquanto houve disponibilidade de recursos fiscais para financiar políticas anticíclicas.

Neste contexto lançou-se a ideia de concentrar as propostas para Rio+20 em dois pontos: a economia para o desenvolvimento sustentável e a reforma ao sistema das Nações Unidas e Bretton Woods, para dar às instituições econômicas um nível maior de coerência em relação às de desenvolvimento, problema originado nos próprios países.

Para muitos países em desenvolvimento havia precedentes que marcavam o processo de preparação da conferência, entre eles, a negociação na Organização Mundial de Comércio (OMC) tendente a liberalizar os mercados para o comércio de bens e serviços para o meio ambiente, produzidos majoritariamente em países desenvolvidos; a tentativa de modificar, em Copenhague, os compromissos dos países em desenvolvimento no âmbito do Protocolo de Kyoto; e o surgimento no comércio internacional de potenciais barreiras como o rastro de carbono e outras. Todos estes aspectos se combinaram para gerar desconfiança em relação ao termo economia ecológica, devido ao temor de um possível distanciamento do conceito de desenvolvimento sustentável. Sem dúvida, estas prevenções requerem ser esclarecidas.

O ponto anterior infelizmente relevou a um segundo plano a discussão ao interior dos países do vasto campo de melhoramentos possíveis em matéria de políticas econômicas e de inclusão social, de acesso à informação e de educação para a sustentabilidade do desenvolvimento. Por esta razão, é importante aproveitar a oportunidade para examinar estas possíveis melhoras.

O balanço regional preparado pela CEPAL em conjunto com outras agências e programas das Nações Unidas evidencia avanços e brechas, tanto sociais e econômicas quanto ambientais, inclusive de cooperação internacional, cuja Assistência Oficial ao Desenvolvimento foi de 0,35%, frente a 0,7% comprometidos. Neste informe, intitulado La sostenibilidad del desarrollo a 20 años de la Cumbre para la Tierra: Avances, brechas y lineamientos estratégicos para América Latina y el Caribe, propõe-se algumas diretrizes para um desenvolvimento mais sustentável.

Entre as propostas relacionadas com a economia destaca-se a necessidade de efetuar uma melhor contabilização e valorização dos custos reais da atividade econômica sobre o meio ambiente e a saúde, e a inclusão nas contas nacionais não apenas do valor agregado, mas também do estado do patrimônio econômico, social e ambiental. Outro passo indispensável é privilegiar os investimentos socialmente inclusivos e de menor impacto ambiental, como o transporte público.

A região da América Latina e do Caribe chega à conferência Rio+20 com vários anos de crescimento sustentado, baixa volatilidade em preços macro e ganhos no âmbito do combate à pobreza e à desigualdade. O setor externo apresenta perspectivas favoráveis em médio prazo. Por isso seria muito adequado que os países da região aproveitassem a oportunidade para dirigir a atenção para dentro e renovar a gestão econômica, orientando os investimentos, compras públicas, taxas de juros, receitas e gastos fiscais e outros instrumentos econômicos em direção à maior sustentabilidade de seu próprio desenvolvimento.

 


 


 

 

 

 

 
 

Nestes 20 anos, o pilar que não foi modernizado para orientar-se ao desenvolvimento sustentável na América Latina e no Caribe foi o da política econômica.

 
  O balanço regional preparado pela CEPAL em conjunto com outras agências das Nações Unidas para a cúpula Rio+20 evidencia avanços e brechas, tanto sociais e econômicas quanto ambientais.