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Se não se conta, a violência contra as mulheres não conta

Foto: Talita Oliveira, Flickr

Um completo panorama da informação disponível sobre a violência contra as mulheres na América Latina e no Caribe, em particular na Argentina, Guatemala, Peru e na sub-região do Caribe, pode ser encontrada no estudo que a Divisão de Assuntos de Gênero da CEPAL preparou como parte de um projeto executado pelas cinco comissões regionais das Nações Unidas.

O informe Si no se cuenta, no cuenta. Información sobre la violencia contra las mujeres analisa a capacidade de cada país para produzir dados e avaliar os impactos que tiveram as distintas iniciativas públicas em matéria de prevenção, sanção e erradicação deste flagelo na região.

O projeto interregional “Fortalecendo as capacidades para erradicar a violência contra as mulheres através da construção de redes locais de conhecimento”, executado na América Latina e Caribe pela CEPAL, responde à convocação do Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, a calcular com dados a incidência deste fenômeno no âmbito de sua campanha “Une-te pelo fim da violência contra as mulheres”, lançada em 2008.

Os dados citados no estudo são reveladores. Os países da América Latina e do Caribe entregaram apenas 48,5% da informação solicitada pelas Nações Unidas para completar a base de dados do Secretário-Geral sobre a violência contra a mulher >. A região segue a Europa (64,4%), porém está mais bem posicionada que a África (20,8%) e a Oceania (14,3%).

No documento se entrega uma série de recomendações para melhorar a resposta dos países tanto em âmbito nacional como regional. Em primeiro lugar, propõe-se “impulsionar a criação de um sistema integral de intervenção, sem fissuras, que entregue coerência interna às respostas setoriais, que funcione sob uma forte liderança política e conte com financiamento adequado e contínuo”.

O sistema proposto, que deveria ser concebido como política de Estado, requer amplos processos de debate e busca de consensos. “Os setores de saúde, justiça, serviços sociais, emprego, educação, os organismos da mulher, as entidades especializadas da sociedade civil e as instituições acadêmicas podem aportar ao debate desde seus conhecimentos particulares”, assinala o texto.

A primeira parte do informe está centrada na perspectiva regional, enquanto na segunda se apresentam estudos de casos da Argentina, Guatemala, Peru e do Caribe, em particular de Trinidad e Tobago.

Segundo o texto, na América Latina e Caribe se empreenderam vários esforços, com distintos graus de avanço, encaminhados a unificar os registros das diversas instituições públicas que intervêm nos casos de violência contra as mulheres.

Trinidad e Tobago, Dominica e Santa Lúcia, na sub-região do Caribe, mostraram progressos nesta matéria, ajudados, provavelmente, pela pequena extensão territorial e sua pouca população, e que pressupõe volumes de informação mais fáceis de administrar.

O Equador avança na formulação de um registro unificado com a intervenção de várias instituições do Estado, enquanto na Guatemala também se trabalha para coordenar os esforços em favor da documentação dos casos, por mandato expresso da lei contra o femicídio e outras formas de violência.

O estudo da CEPAL destaca que a grande maioria dos países da região conta com normas de natureza civil, penal ou de ambas, para abordar as diversas manifestações de violência contra as mulheres, em particular a violência doméstica ou intrafamiliar. Em contraste, as manifestações de violência sexual dentro do matrimônio, o tráfico de pessoas ou o acosso sexual encontram-se menos legisladas.

Por outro lado, poucos países da América Latina e Caribe contam com uma lei integral que coordene as instituições e os programas relacionados com a violência de gênero, como sucede na Argentina, Colômbia e México. “Mas, inclusive nesses países os sistemas jurídicos dispõem de normas específicas que abordam as distintas manifestações de violência e geram processos com suas particularidades próprias”, adverte o texto.

Apesar de destacar a importância de contar com legislações adequadas para erradicar este flagelo, o informe recorda que “o problema da violência contra as mulheres, por sua complexidade e múltiplas arestas, não se resolve exclusivamente com leis nem com apoio psicológico e social. Também exige ações dirigidas a transformar a cultura e as condições em que se estabelecem e consolidam as relações sociais”.

“O caminho está. Chegou a hora de percorrê-lo, com a produção de informação mais ampla e acessível de melhor qualidade, com maior transparência e crescente articulação de esforços, a partir de um melhor entendimento dos nós críticos persistentes, que deverão ser eliminados no avanço em direção à meta de prevenir e erradicar a violência contra as mulheres”, conclui.


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Os países da região entregaram apenas 48,5% da informação solicitada pelas Nações Unidas para completar a base de dados do Secretário-Geral sobre a violência contra a mulher.

 
 

Poucos países da América Latina e do Caribe contam com uma lei que coordene de forma integral as instituições e programas relacionados com a violência de gênero.